"Os Insones"
Tony Bellotto
editora Cia das Letras
237 páginas
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"Numa cidade onde a violência, além de dominar os morros e ditar as
regras de comportamento, conquista os corações e mentes dos jovens, os
insones se multiplicam. Neste livro, todos estão sujeitos a uma brutal
ansiedade, a começar pelo pai apavorado com o sumiço da filha e
torturado por dores na coluna, até o aparentemente sereno jovem decidido
a mudar o mundo na marra, passando por traficantes encurralados,
agentes infiltrados e policias vivendo sobre tensão constante."
Em mais um romance emocionante, Tony Bellotto confirma sua facilidade em escrever estórias sobre as coisas mais cotidianas e com elas prender o leitor até o ponto final. Aqui conhecemos um grupo de jovens, determinados a mudar o mundo, cada um à sua maneira, e alguns adultos consternados e entregues à mesmice de suas vidas. Samora é um garoto negro, mora no Leblon e quer fazer uma grande revolução, como se fosse um Robin Hood moderno, redistribuindo renda e cuidando daqueles que mais precisam; Sofia é branca, mora em Ipanema, saiu de casa e nunca mais foi vista, para desespero de seu pai, Renato, um publicitário frustrado, já no segundo casamento e com dores terríveis nas costas. Seu outro filho, Felipe, é um adolescente tentando encontrar sua própria identidade e que coleciona asmas escondido dos pais. Mara Maluca, meio mulata, meio índia, é a atual chefe do morro e não tem nenhum sangue-frio, sendo capaz de cometer as maiores atrocidades contra quem cruzar seu caminho.
Todos
os personagens têm em comum uma certa urgência, querem viver agora,
querem realizar seus sonhos e seus ideais hoje. Desde o pai, Renato, que
se descobre um homem vazio e sem ambições enquanto tenta encontrar a
filha desaparecida, até a moradora do morro Chayenne, aspirante a atriz e
que tem como característica marcante suas unhas pintadas de vermelho e
preto. Todo mundo está tentando dar algum sentido real a sua vida.
O
mais legal nesse livro é o ritmo que Tony imprimiu à história,
usando sempre parágrafos breves, cheios de significados, e que vão
carregando o leitor para uma trama alucinante. Ao terminar um
desses fragmentos, o leitor é praticamente compelido a passar para o
seguinte, sem pausas para respirar ou tomar uma água, totalmente envolvido pela
inteligência dos personagens e suas atitudes extremas, como quando
Samora invade a casa de câmbio do pai de um ex-colega de colégio, rouba
uma fortuna e sai jogando parte do dinheiro na rua, sob o pretexto de
distribuir renda para quem realmente precisa.
Diante
do ideal revolucionário de Samora, a patricinha Sofia não se contém e
segue junto a fim de concretizar seus planos revolucionários: ela foge de casa e vai viver com ele, no morro. Enquanto isso, sua família
e a polícia do Rio de Janeiro estão loucos atrás dela, tentando
resgatar o casal com vida. Mas eles estão sob a proteção da
traficante Mara Maluca, que, para aceitar Samora em seu grupo, o fez
passar por um terrível ritual de inicialização, atirando na cabeça de um
homem acusado de estupro. É assim que as coisas são resolvidas ali, a
ferro e fogo.
Não
há como parar de ler esse livro antes do final. Como ele é contado em
partes, cada parágrafo fala um pouco da história de um personagem, e
eles vão sendo intercalados, o leitor não consegue sair de dentro da estória, e quer passar para o próximo e depois o próximo e depois o próximo, tentando dar um desfecho para a saga de seu personagem favorito (ou não).
Trechos
como o que Renato recebe a massagista no quarto do hotel e estende a
mão para cumprimentá-la e ela não retribui o gesto dão um toque de
humor leve e que quebra um pouco toda a tensão do enredo, deixando o clima mais agradável.
Sou
fã do autor, e portanto, suspeita para fazer elogios muito intensos,
mas posso dizer que esse foi o melhor livro dele que já li. É bem
diferente da série "Bellini", e só me fez gostar ainda mais do
seu estilo, misturando romance com a trama policial e trazendo tudo isso para a nossa realidade. As
entrelinhas desse livro são cheias de significado, e fazem algumas
críticas à nossa sociedade tão violenta.
Para
finalizar, ouvi alguém dizer uma vez em alguma entrevista que toda obra
traz pelo menos um traço do seu autor, e passei a pensar sempre nisso
quando escrevia alguma coisa, tentando ver algum indicio de pessoalidade nos meus escritos.
Nesse romance, Tony presenteou o personagem Renato com uma hérnia de disco que lhe
causa dores insuportáveis, e não seria totalmente errado afirmar que ele o fez
inspirado por suas próprias dores que, como ele mesmo definiu uma vez,
são efeitos colaterais de todos esses anos carregando uma guitarra nas
costas.
Leitura
indispensável para quem quer prestigiar os autores brasileiros, para os
fãs de Tony e para quem curte um bom romance/policial.
Joana Masen
@joana_masen
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