"O espadachim de carvão"
Affonso Solano
editora Fantasy - Casa da palavra
256 páginas
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"Filho de um dos quatro deuses
de Kurgala, Adapak vive com o pai em sua ilha sagrada, afastada e
adorada pelas diferentes espécies do mundo. Lá, o jovem de pele
absolutamente negra e olhos brancos cresceu com todo o conhecimento
divino a seu dispor, mas consciente de que nunca poderia deixar sua
morada. Ao completar dezenove anos, no entanto, isso muda. Uma situação
inesperada o obriga a fugir e lutar por sua própria vida, se expondo aos
olhos do mundo pela primeira vez. Todos os seus conhecimentos teóricos e
sua excelente técnica de combate têm que ser explorados durante essa
fuga e na busca pela identidade daqueles que desejam acabar com os
deuses de Kurgala."
O
autor Affonso Solano cria em seu livro de estreia um universo
fantástico totalmente novo, com algumas peculiaridades interessantes,
como por exemplo, a medida de tempo em ciclos, e não em anos, como
estamos habituados. Esse mundo novo exige que o leitor se adapte a ele
enquanto desenvolve a leitura, ou que ele já seja um adepto da
literatura fantástica, o que não é o meu caso, pois ainda estou
iniciando nesse gênero literário. Mesmo assim, achei o livro muito bom.
No início minha leitura ficou um pouco lenta, exatamente por estar em
processo de adaptação e conhecimento do cenário onde a estória se passa,
e depois de superada essa barreira pessoal, a leitura fluiu normalmente
e se tornou muito interessante.
Adapak
foi criado durante anos numa caverna, sem contato com o mundo exterior, tendo apenas seu pai como companhia. Ele tem a pele totalmente negra, diferentemente das demais criaturas de
Kurgala, e isso causa estranheza em algumas pessoas quando ele deixa a caverna, mas há uma razão
para que ele seja assim, que é explicada no desfecho da estória. Ele
também é um exímio lutador, treinado a vida toda para agir de acordo com
um tipo de arte regida pelos Círculos, que vão direcionando o
espadachim em suas decisões, e fazendo com que ele use suas habilidades
de lutador apenas para se defender, e não para atacar.
Apesar
de ser muito inteligente e conhecer quase todos os assuntos através de
seus livros, que ele leu a exaustão antes de sair de sua caverna, Adapak é muito inocente, não sabe como agir com relação a
outras pessoas e não entende algumas ironias ou malicias, tanto que,
logo no início de sua fuga, ele é facilmente ludibriado por um
aproveitador, e acaba preso sem motivo. Sua ingenuidade diante de
situações comuns da vida é tão latente que em alguns momentos ele chega a
parecer uma criança indefesa, mesmo já tendo 19 ciclos de idade. Essa é
uma característica importante do personagem e é interessante ver como
ele vai crescendo nesse sentido, deixando de ser tão puro, aprendendo o
quanto o mundo pode ser cruel e descobrindo como ele deve reagir a isso
sem ferir seus princípios.
Há
grandes perdas pelo caminho de Adapak, mas ao mesmo em tempo que isso o
entristece e o deixa confuso quanto ao que realmente está acontecendo,
também o fortalece e o ajuda a continuar buscando o real motivo de estar
sendo perseguido. Nesse processo de autoconhecimento, até a perda de
seu único amor ajuda na formação de sua personalidade, enquanto ele
reflete sobre os motivos de ter sido abandonado pela mulher que amava e
se o relacionamento dos dois foi mesmo tão intenso e verdadeiro como ele
imaginava.
As
cenas de luta são muito detalhadas e isso as deixa bem empolgantes: é
possível imaginar claramente o cenário das disputas através das
descrições do autor e até os movimentos de Adapak, precisos e
eficientes, enquanto ele usa as espadas para se defender daqueles que o
atacam.
O
ápice da estória é quando Adapak descobre quem o está perseguindo e
qual o motivo para isso. A essa altura, o protagonista já fez alguns
poucos amigos, entre eles a capitã do barco em que ele atravessou o mar,
chamada Sirara, que o ajuda a encontrar respostas para algumas de
suas dúvidas mais profundas. Então, quando seu algoz cerca Adapak, ele pega
Sirara como refém para persuadi-lo a se entregar. Confesso que
fiquei boquiaberta com o que aconteceu aqui, mas não darei nenhum
spoiler.
O
final da estória é feliz, e quando o livro acabou eu me sentia parte da
vida de Adapak, queria saber o que iria acontecer depois e como ele se
comportaria dali pra frente. Até para aqueles que, como eu, não são
leitores típicos de fantasia, o livro vale muito a pena, É uma estória
curtinha, que acaba nela mesmo, sem deixar enigmas para serem
desvendados num segundo volume, com uma narrativa contemporânea e de fácil compreensão.
Destaco
o estilo narrativo adotado por Solano, com duas linhas temporais
distintas e que se intercalam, capítulo a capítulo, interrompendo o
fluxo de leitura em momentos estratégicos e fazendo com que o leitor
quebre aquela onda de adrenalina e tenha que voltar a um momento
anterior, a outro lugar, com outros personagens e situações diferentes.
Isso, além de um exercício para quem lê, mostra grande habilidade do
autor, pois não é fácil trabalhar com esse tipo de escrita e conseguir
manter a estória interessante para o leitor, que pode acabar esquecendo o
que se passou anteriormente, ou até separar a estória em duas partes
distintas, não fazendo o elo de ligação natural entre uma e outra.
Indico
o livro para todos, e acho que seria interessante que mais jovens o
lessem, por possuir uma linguagem bem acessível e dar uma boa base para a
formação de leitores, servindo como porta de entrada para o universo
fantástico.
Joana Masen
@joana_masen
Joana Masen
@joana_masen
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