Assim que as autoridades tiraram os filhos dos braços de Caroline, nada mais sobrou no seu universo de pouca iluminação e esperança. "Este é o lugar onde ela estava deitada com a cabeça quando foi para a cama ontem à noite", narra Lou Reed, a voz embargada de emoção. "E este é o lugar onde nossos filhos foram concebidos... E este é o lugar onde ela cortou os pulsos". Encerrava-se, ali, uma das histórias mais angustiantes do rock.
Em julho de 1973, Lou Reed tinha 31 anos de idade e há sete meses vivia sob a sombra de "Transformer", seu trabalho mais popular. Chamado de "poeta das ruas" por seus admiradores, Reed não parecia muito feliz com o sucesso de um disco marcado pela "alegria" - ainda que nas entrelinhas - e pela sua influência decisiva na propagação do glam rock pelo mundo. Como um bom poeta, Reed decidiu então mergulhar de alma em um universo de desespero, melancolia, tristeza e desesperança - uma temporada no inferno, como Rimbaud gostaria de chamar. Assim, em julho de 1973, foi lançado o disco "Berlin". Sobre a cinzenta Capital da Alemanha, somos apresentados ao casal Jim e Caroline rumo à implosão e ao esquecimento. Drogas, violência, sexo casual e suicídio perfumam o ambiente frio, calado. "O ciúme, a inveja. Existem certos assuntos que sempre se destacam, e o ciúmes é uma grande real. Mostre-me um homem que nunca foi ciumento", declarou Lou Reed ao jornal britânico "The Guardian" anos atrás.
A cantora Nico e Lou Reed no fim dos anos 60, época de Velvet Underground. |
Inspirado na clássica história de "Otelo", escrita por William Shakespeare por volta de 1603, "Berlin" foi concebido como uma ópera rock e quebrou a cara de todos que esperavam por um novo "Transformer". Se as letras apresentavam uma profundidade de extremo impacto, as melodias não ficaram para trás: Reed costurou um caminho repleto de metais pesados e arranjos orquestrais de cortar o coração. O músico contribuiu apenas com o violão, e olhe lá. "The Kids" é tida como um dos momentos mais desesperadores da História do Rock, quando Caroline tem seus filhos retirados pelas autoridades, enquanto ouvimos crianças chorando e gritando para sua mãe. "Eu sou apenas um homem cansado", diz Jim, namorado de Caroline, "Sem palavras para dizer. Mas desde que ela perdeu a filha, são os olhos dela que se enchem de lágrimas. E eu estou muito mais feliz desta forma".
Gravado em estúdios no oeste de Londres, na própria Berlim e na cidade de Nova York, a concepção de "Berlin" foi muito mais intensa do que parece. Na época de sua composição, Lou Reed estava rompendo com sua primeira esposa, a ex-garçonete Bettye Kronstadt. Ao mesmo tempo, Bob Ezrin, produtor do disco e fiel amigo de Reed, estava usando muitas drogas e todo o trabalho foi gerado ao lado de muitas viagens de LSD, heroína, cocaína e maconha. Ao fim da produção, Ezrin levou um ano inteiro para conseguir se recuperar da experiência.
Quando lançado, o disco chegou a ser chamado de "desastroso" pela revista norte-americana Rolling Stone. Sobre esse fato, Reed tem a resposta na ponta da língua: "Rolling Stone? Quem se importa? Eu não escrevo para eles". Mais uma vez, o poeta havia descido ao inferno e retornado ileso. Ele tinha apenas que juntar todos os cacos deixados pelo seu caminho pisado.
Por Adolfo Ifanger
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O blog Viagem a cores é muito bom, principalmente pelo conteúdo, tanto que esse texto veio de lá .... mas o blog de vocês é show também, por causa do visual que eu acho que faz a diferença ... por isso votei em vocês no concurso.
ResponderExcluirUm abraço do Net Esportes
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esse é o seu melhor texto, adolfo... continue assim!
ResponderExcluirbeijao.
nossa!!
ResponderExcluirbem legal!!